
No século XIX, Jean-Pierre Falret (1794 - 1870), um psiquiatra francês, apresentou, em uma de suas aulas sobre lições clínicas no Hospital Salpetrière, um conceito que caracterizava “uma forma de insanidade que nós chamamos de circular, feita de alternâncias entre períodos de excitabilidade e períodos usualmente mais longos de depressão”.
Conhecido como o “pai da medicina”, Hipócrates (460–370 a.C.) descreveu quadros que alternavam entre dois estados extremos de humor - melancolia (depressão) e mania. Ele atribuiu estes sintomas a desequilíbrios nos humores corporais, particularmente à “bile negra” para a melancolia e à “bile amarela” para a mania. Este entendimento inicial, pautado na ja ultrapassada “teoria humoral” moldou, inicialmente, a compreensão dos transtornos de humor como parte do temperamento ou da personalidade do indivíduo, ao invés de os entender como distúrbios episódicos e separados da personalidade basal do sujeito, como são aceitos hoje.
Arateus da Capadócia (século I d.C.) forneceu uma das primeiras análises registradas de sintomas semelhantes ao que conhecemos hoje como o transtorno afetivo bipolar (TAB) - ou apenas transtorno bipolar (TB) -, observando oscilações entre a depressão e a mania. Arateus também mencionou tratamentos para esta condição utilizando sais de banho, entre os quais especula-se pode ter incluído o lítio, uma substância ainda utilizada no tratamento do TAB atualmente.
Durante a chamada Idade Média, as doenças mentais foram frequentemente atribuídas a causas sobrenaturais ou a “falhas morais”, limitando o progresso científico. Ainda assim, no século XVI, o enciclopedista chinês Gao Lian descreveu transtornos de humor em seus “Oito Tratados sobre o Cuidado da Vida”, oferecendo um reconhecimento precoce, na medicina oriental, de sintomas semelhantes aos que conhecemos hoje como sendo do TAB. Em 1621 o acadêmico inglês Robert Burton (1577 - 1640) publicou o livro “The Anatomy of Melancholy” (A Anatomia da Melancolia), focando-se especificamente na depressão. Este texto foi bastante influente e hoje é tido como um dos primeiros grandes escritos a tratar sobre a depressão no campo do que hoje conhecemos como “saúde mental”.
Posteriormente e já no século XIX, Jean-Pierre Falret (1794 - 1870), um psiquiatra francês, apresentou, em uma de suas aulas sobre lições clínicas no Hospital Salpetrière (da qual o conteúdo foi publicado em 19 de janeiro de 1851), um conceito que caracterizava “uma forma de insanidade que nós chamamos de circular, feita de alternâncias entre períodos de excitabilidade e períodos usualmente mais longos de depressão”. Falret cunhou o termo "folie circulaire" (“insanidade circular”), descrevendo episódios alternados de mania e depressão com períodos de normalidade do humor. Ele também identificou o que acreditava ser a existência de um componente genético para a condição, uma percepção que ainda é apoiada hoje.
Jules Baillarger (1809 - 1890) descreveu, independentemente, uma condição semelhante enfatizando as transições entre mania e melancolia sem necessariamente a presença de intervalos assintomáticos. Historicamente, refere-se que em janeiro de 1854, Baillarger realizou uma apresentação na Academia Francesa de Medicina intitulada: “Uma forma de insanidade caracterizada por dois períodos regulares, um de depressão e outro de excitabilidade”, propondo então o nome "folie à double forme" (“insanidade de forma dupla”). Essa distinção destacou padrões diferentes de ciclagem de humor. Cabe ressaltar que, nesta época, os transtornos mentais não eram compreendidos e categorizados como são hoje. Basicamente as “alienações mentais” eram consideradas um grupo homogêneo, caracterizadas pela alteração comportamental e comprometimento das capacidades mentais.
Estes desdobramentos contribuíram para que, nos anos 1870, os termos “mania” e “melancolia” evoluíssem de descritores gerais de níveis de atividade para diagnósticos mais específicos relacionados ao humor, já com alguma semelhança à compreensão atual do TAB.
O século XX foi palco de grandes avanços na compreensão do TAB, incluindo a caracterização de fundamentos biológicos e classificações diagnósticas modernas.As ideias de Falret foram adotadas na Alemanha pelo psiquiatra Karl Ludvig Kahlbaum (1828 - 1899), o qual reconheceu o empenho clínico dos psiquiatras franceses em sua monografia sobre a catatonia, no ano de 1871. Através do reconhecimento de Kahlbaum, os conceitos de Falret tiveram uma influência importante em outro psiquiatra alemão, Emil Kraepelin (1856 - 1926).
Kraepelin cunhou o termo psicoses maníaco-depressivas, distinguindo-o da esquizofrenia. Ele enfatizou as causas biológicas e documentou o curso natural do transtorno bipolar não tratado, incluindo períodos de remissão entre os episódios de humor. Seu trabalho continua sendo fundamental para as classificações psiquiátricas modernas. Essa distinção posteriormente influenciou a classificação do transtorno bipolar I (mania) e do transtorno bipolar II (hipomania). Karl Leonhard propôs subcategorização para transtornos de humor, introduzindo os termos bipolar (mania e depressão) e unipolar (apenas depressão). Isso marcou um passo significativo para refinar as categorias diagnósticas.
O termo “transtorno bipolar” substituiu “doença maníaco-depressiva” em 1980 com o DSM-III para reduzir o estigma e refletir melhor a natureza espectral do transtorno (incluindo não apenas a existência da mania, como também da hipomania, a qual caracteriza o TAB tipo II). Subtipos como o bipolar tipo II e a ciclagem rápida foram introduzidos no DSM-IV com base em pesquisas desenvolvidas na década de 70 do século passado.
Essa progressão histórica reflete uma mudança das teorias humoriais para os quadros biológicos, levando a critérios diagnósticos mais detalhados que moldam a compreensão contemporânea e as estratégias de tratamento para o transtorno bipolar.
Referências:
No século XIX, Jean-Pierre Falret (1794 - 1870), um psiquiatra francês, apresentou, em uma de suas aulas sobre lições clínicas no Hospital Salpetrière, um conceito que caracterizava “uma forma de insanidade que nós chamamos de circular, feita de alternâncias entre períodos de excitabilidade e períodos usualmente mais longos de depressão”.
O transtorno afetivo bipolar (TAB) - também denominado transtorno bipolar (TB) ou “bipolar disorder” (BD) no inglês - afeta em torno de 40 milhões de pessoas em todo o mundo, segundo a World Health Organization (WHO). Além disto, a incidência do transtorno vem aumentando, principalmente entre adolescentes e jovens adultos nas últimas décadas.
Mudanças hormonais ao longo da vida da mulher, especialmente as flutuações nos níveis de estrogênio e progesterona, parecem desempenhar um papel significativo no desenvolvimento e na gravidade dos transtornos do humor.
Um estudo recente publicado na Nature Molecular Psychiatry explora os aspectos cerebrais funcionais do transtorno afetivo bipolar (TAB).
O lítio é um elemento natural que tem sido utilizado como estabilizador do humor por décadas, principalmente no tratamento do transtorno afetivo bipolar (TAB).
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